
Energia Solar, camisa simbólica e comunicação direcionada engrandecem equipe da Ilha do Governador
O Flamengo foi impecável em aproveitar nas quatro linhas os frutos de um trabalho (ainda que com problemas) capaz de acomodar o clube em berço esplendido. Trabalho que em 2019 recolocou a equipe carioca no centro do Brasil. Porém, a bonança flamenguista não representa a realidade geral. Talvez não represente nem mesmo a realidade do próprio clube e de sua vizinhança, na qual vive e convive.
Ainda que cercado de contradições, Flamengo e o futebol carioca são exuberantes; conjugam histórias e prestígio. Equipes fantásticas, jogadores colossais, o maior palco do planeta, além de um tempero a parte na cultura brasileira; máquinas vultuosas de importância e significância esportiva, financeira, mercadológica e política.
Tal entrada serve para destacar coadjuvantes.
No dia oito de Janeiro, no estádio Luso-Brasileiro, a #portuguesarioofc Associação Atlética Portuguesa do Rio venceu o Nova Iguaçu por 3x2 garantindo avançar a Jornada Preliminar e disputar o Carioca entre os grandes. Invicto e líder da preliminar evitou o Fla no Luso-Brasileiro, seu estádio. Embora uma missão difícil, pegar a coqueluche nacional já de cara seria uma ótima oportunidade ao simpático estádio e à própria Lusa Carioca.
O estádio, também chamado de Ventos Uivantes, foi inaugurado em 1956, está localizado no Ilha do Governador e tem capacidade para 20.500 pessoas. Integra a mística do futebol do estado, harmoniza as coisas do tempo contando fatos e notícias de inquilinos e convidados importantes, além de acomodar a herança da Portuguesa, um legado singelo diante de vizinhos tão grandiosos.
Já a Associação Atlética Portuguesa, equipe de 95 anos, estreou no carioca contra o Madureira diante de todas as dificuldades da maioria dos clubes de futebol nacional.
Ao que aqui nos reservamos, nossos atores principais são a Lusa e seu estádio. Mística, grandeza, importância; adjetivos com linhas peculiares à cultura da bola.
Aos fatos:
a Portuguesa do Rio otimizou sua estrutura física e investiu em tecnologia para captação de energia solar, a partir de 2020 gerará parte de sua necessidade prevendo econômica de até 95% nas contas de luz e ainda abastecendo o Bairro da Portuguesa com seu recurso limpo.
A abordagem das questões ambientais na gestão de uma infraestrutura desportiva ou relacionadas com um evento desportivo deve ponderar de forma integrada como lidar com a complexidade de assuntos que se relacionam com um desenvolvimento sustentável (FERREIRA, 2015. p.36). Neste ponto, a Lusa caminha no destino certo.
Segundo a assessor de imprensa da Portuguesa, André Oliveira, as obras de instalação das placas já começaram e sua operação é breve.
Em Manual de Boas Práticas no Desporto, uma das bases atuais sobre desporto e sustentabilidade, dentre os aspetos-chave na abordagem sustentável de um evento ou infraestrutura desportiva, Jose Ferreira enfatiza a questão energética e em encontrar formas de minimizar o uso de energia para reduzir as emissões e custos. Projetar instalações e infraestruturas para um reduzido uso de energia, incorporando medidas de eficiência energética e maximizando o uso de energia renovável.
Tratando-se de energia e sua complexidade de pequenos e grandes detalhes, o uso de tecnológica solar no ambiente esportivo não é novidade no Brasil. Caso o leitor não saiba, Mineirão, Mané Garrincha, Pituaçu, Arena Pernambuco e Maracanã são exemplos de estádios explorando corretamente as grandes áreas expostas com usinas fotovoltaicas.
Então aparecem outros detalhes que mostram o caminho diferenciado seguido pela Lusa na correção de sua pegada ecológica. Uma vez em sintonia com esta filosofia, o clube apostou em levar à sua camisa marcas bem claras da nova adesão. Em todas as versões de jogo dos uniformes 2020 é possível identificar marcas de folhas em relevo. Segundo a assessoria do clube, um registro simbólico, um selo de autenticidade.

“Nossas camisas em 2020 já contam com o recado, um selo verde. Elas têm uma textura de linhas que remetem ao verde, são flores e plantas em relevo. É um recado que queremos passar, que a Portuguesa está se tornando um clube sustentável, um clube que preza pela sustentabilidade”, explica o assessor André Oliveira.
“Pretendemos expandir essas ideias para a população, até porque ela vai utilizar a energia gerada. A partir do momento da captação a energia será levada para o bairro inteiro”.
A mecânica toda fornece elementos ambientais e individuais importantes, influenciando a comunidade a qual a Lusa está inserida e aqueles aos quais suas ações alcance na tomada comportamental, sobretudo em razies afetivas e cognitivas (MULLIN, H e S, 2004. p.51).
Outro esforço adotado é o trabalho com a mídia local em ação de comunicação direcionada.
“Obviamente, por estarmos localizado em um bairro, buscamos fazer panfletagens e outras medidas mais diretas. Temos um jornal parceiro da região que está conosco na iniciativa e sempre que possível explicamos quanto a importância deste momento que a Portuguesa vive, de preservar e cuidar do meio ambiente”.
Percebe-se uma ação de amplitude local ou universal, avalizando as trocas necessárias para propagação e adesão conforme interesses justapostos. As instituições desportivas, os clubes, aos agentes, as respectivas unidades territoriais onde estão inseridos, são entendidos assim, neste espaço comunicativo, como entidades produtoras e manipuladoras de informação. Ela representa atividades, praticantes, instalações, instituições desportivas e dá significado às respectivas ações e aos investimentos realizados, pela aplicação das políticas, (CUNHA, 2003. p.84)
Sobre a aposta energética, trata-se do primeiro clube brasileiro a investir neste tipo de iniciativa em seu estádio levando a população de maneira formatada. Vale lembrar, as modernas arenas citadas são de iniciativa púbica com construções sobre normas do caderno de encargos da FIFA.
No caso da Portuguesa, um clube de econômica modesta na busca de alternativas financeira/administrativas explorará a usina limpa. Não sendo apenas um pano de fundo, a Lusa capitaneia algo importante junto às instituições esportivas. Nem mesmo os grandes eventos no Brasil conseguiram aderir percepções de progresso, evolução, desenvolvimento ou nova cultura de maneira eficaz.
Chris Gratton e Holger Preuss, em “Maximizing Olympic Impacts by Building Up Legacies”, discutem sobrea ideia de legado nos trazendo a noção de espólios intangíveis, ou positivos, como revitalização urbana, aprimoramento internacional, reputação, aumento do turismo, melhoria do bem-estar público [...] chances de marketign das cidades, espírito comunitário renovado, melhor cooperação inter-regional, produção idéias, produção de valores culturais, memória popular, educação, experiência... (GRATTON E PREUSS, 2008. p.1923). Em termos gerais, para os autores, não é possível, naquilo que precede e sucede grandes eventos, ignorar as heranças de vários graus e níveis. Isso porque o impacto social econômico e cultural do desporto é colossal, mexe com emoções, cultura e conhecimentos.
Não é possível falar em legado em tais proporções, mas o racional e pertinente é discorrer sobre ‘exemplo’. Para uma equipe local, seu estádio e relação com a comunidade gosto da ideia de microcosmo, ou de pequena fração. É razoável, ainda, usar tal prisma para entender uma dinâmica constituída, a Lusa está sim fazendo parte da formação do inconsciente de seus torcedores de forma relativamente barata e inteligente promovendo pelo esporte a noção de sustentabilidade. O uso dos painéis, somados às outras iniciativas edificam a noção de um clube ativo. Algo muito importante para o Rio de Janeiro, mas igualmente à percepção do esporte com catalizador de sustentabilidade.
Seria uma das grandes tirânicas não sobrelevar a iniciativa da Lusa, a 111º equipe no ranking da CBF, diante à máquina vultuosa. A equipe da Ilha do Governador buscou soluções internas capitalizando sobre um discurso “clichê” em nível de autenticidade para fugir de uma simples fantasia marketeira. Este argumento tem prova real; primeiro em razão do esforço em fazer valer tal premissa em seu local geográfico com ajuda de mídia e comunicação própria. A outra será o tempo. Caberá à Lusa provar sua genuinidade mantendo o compromisso. Afinal, a proteção do ambiente e a promoção do desenvolvimento sustentável no quadro da atividade desportiva são possíveis e desejáveis porque: promovem o usufruto da natureza aumentam a consciência em relação aos problemas ambientais; reduzem o uso de recursos e de poluição; promovem a inclusão social, (FERREIRA, 2015. p. 27).
Não se vê no futebol do Rio algo tão verdadeiro.
REFERÊNCIAS
CUNHA, Luis Miguel. O Espaço, O Desporto e o Desenvolvimento. Lisboa, 2003. FMH – Ulisboa.
FERREIRA, Francisco. Manual de Boas Práticas Ambientais no Desporto: Ética Ambiental. 2015, Instituto Luso- Ilírio para o Desenvolvimento Humano, Lisboa. ISBN: 978-989-8817-04-4.
GRATTON, Chris e PREUSS Holger. The International Journal of the History of Sport. Maximizing Olympic Impacts by Building Up Legacies. Building Up Legacies, The International Journal of the History of Sport. 2008. Link permanente: https://doi.org/10.1080/09523360802439023.
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